“Juiz considera pôquer jogo de azar e condena 13 pessoas no Rio
Técnica ou sorte? Treze pessoas foram condenadas a prestar serviços comunitários após serem detidas no interior de uma casa em que promoviam o jogo de pôquer. A prisão aconteceu em 2010.
A sentença, proferida no dia 24 de abril, foi dada pelo juiz Joaquim Domingos de Almeida Neto, do 9º Juizado Especial Criminal. Almeida Neto atendeu pedido do promotor Márcio Almeida considerando o pôquer jogo de azar.
A decisão promete gerar discussão e polêmica. Análise de peritos do Instituto de Criminalística de São Paulo, anexado ao processo, atestou que o jogo ‘depende da técnica do jogador’.
Já os peritos do Rio entenderam diferente. Consideram pôquer um jogo de azar, que depende da sorte do jogador e não da técnica. A sua decisão abre um precedente para que se passe a reprimir o jogo no Estado do Rio.
O juiz destaque o fato de que não é possível desprezar a habilidade do jogador, mas o resultado final do jogo depende da combinação de cartas.”
Segundo nossa Lei das Contravenções Penais (que é a mesma lei usada pelo magistrado para punir as pessoas no caso acima), jogo de azar é o jogo em que o ganho e a perda dependem exclusiva ou principalmente da sorte, além das apostas sobre corrida de cavalos fora de hipódromo ou de local onde sejam autorizadas e das apostas sobre qualquer outra competição esportiva.
Mas, como é óbvio, o próprio governo explora vários jogos de azar que entram nessa definição. O governo pode porque o objetivo da legislação é justamente impedir concorrência a essa fonte de recursos governamentais. Uma das controvérsias geradas pelas casas de bingo, aliás, é justamente relacionada a isso. Elas são locais privados de jogos de azar (para ganhar no bingo você depende apenas da sorte). Elas se diferem das lotéricas porque estas são apenas intermediárias recolhendo dinheiro e repassando os bilhetes: a loteria pertence ao governo).
A decisão acima é interessante porque os jogadores de pôquer dizem que é o único jogo de cassino em que realmente depende-se muito mais do talento matemático e da capacidade de ‘ler’ o adversário do que da sorte. Ou seja, tem um elemento de sorte (que carta vai sair para você) mas ele é apenas colateral e não principal.
Sorte é necessária em qualquer coisa na vida. Qualquer jogo - futebol, bolinha de gude ou de botão - necessita de sorte. O que a Lei citada acima proíbe é jog no qual a sorte é o principal ou único elemento. Daí a importância de se saber se no pôquer o que é mais importante: talento ou sorte.
Para o Judiciário (e para a polícia) esse tipo de decisão é uma dor de cabeça porque, invariavelmente, há recurso contra a decisão e se o tribunal acima decidir que o magistrado de primeira instância errou, a notícia acaba sendo amplamente divulgada e aquilo em que ninguém prestava atenção ou se importava, passa a ser o centro de uma disputa social. Para complicar, invariavelmente dezenas, centenas ou milhares de ‘empreendedores’ à espera de uma ‘boa ideia’ usarão a decisão do tribunal para iniciar suas casas de pôquer.
Deixando esse debate de lado, há outro detalhe interessante na lei: ela não proíbe jogos de azar. O que ela proíbe são jogos de azar em lugares públicos ou acessíveis ao público (o que inclui a casa particular em que se realizam jogos de azar, quando deles habitualmente participam pessoas que não sejam da família de quem a ocupa; o hotel a cujos hóspedes e moradores se proporciona jogo de azar; as dependências de sociedade ou associação, em que se realiza jogo de azar; e o estabelecimento destinado à exploração de jogo de azar, ainda que se dissimule esse destino). Logo, jogar cartas com familiares em casa não é delito. O problema surge quando você passa a convidar estranhos habitualmente para jogar em sua casa. O que ‘habitualmente’ significa depende do magistrado.